Na Biblioteca
O que não pode ser dito
O que não pode ser dito
guarda um silêncio
feito de primeiras palavras
diante do poema, que chega
sempre demasiadamente tarde,
quando já a incerteza
e o medo se consomem
em metros alexandrinos.
Na biblioteca, em cada
livro,
em cada página sobre si
recolhida, às horas mortas
em que
a casa se recolheu também
virada para o lado de dentro,
as palavras dormem talvez,
sílaba a sílaba,
o sono cego que dormiram as
coisas
antes da chegada dos deuses.
Aí, onde não alcançam nem o
poeta
nem a leitura,
o poema está só.
E, incapaz de suportar
sozinho a vida, canta.
poema: “Na
Biblioteca”
autor: Manuel
António Pina (1943-2012)
obra: Poesia Reunida, Assírio & Alvim,
2001, pág. 181
voz: Ana
Celeste Ferreira
fotografia: Luis Mateus - Lounge Fotografia
captação e edição sonora: Ricardo Caló
Belo poema Ana Celeste! Que me lembre, não conhecia este do Pina, mas obrigada por me dares a conhecer.
ResponderEliminarÉ maravilhoso, Maria! Considero-o mesmo um dos mais comoventes textos contemporâneos. :)
ResponderEliminarAbraço poético* :)